21 de junho de 2014

Outra história
(II)
Suzette Rizzo

Olhos cravados em algo
que ninguém via...
Alonguei o olhar no rosto pensativo
tentando adivinhar
o turbilhão que ele sentia.
Um dia eu soube
a constância daquele devaneio
e a causa do desnorteio
visível porém guardado
na alma e no peito.
Lembrava dos seus cães,
do carinho que não teve...
Lembrava do dia da adoção,
depois do frio na calçada,
de quando  botou o pé na estrada
e sofreu,
sofreu tudo que agüentou
da vida madrasta.
Conhecer-me  não aliviou,
nada aliviava...
somente quanto postava as mãos,
cerrava os olhos
e agradecia cada grão
que Deus mandava.
Então, adormecia como fosse leve,
como se nada preocupasse 
como se a vida fosse breve...


E se foi, com trinta e sete.


Gosto
Suzette Rizzo

Gosto, quando a idéia flui mais fácil
e percebo-me dentro de coerências,
que nem acredito minhas...
E brota uma idéia bonita,
um acorde de palavras calmas,
que rimam e deslizam das profundezas
da minha alma,
talvez, boa alma!

Gosto, quando tuas mãos
tocam leve, qualquer parte de mim,
nestes sonhos solitários, malucos,
donos da papelada,
onde deixo idéias adentrarem
os sentidos,
buscando qualquer abrigo,
por entre os muitos véus
do teu ser encoberto!

Gosto, não sei, se da poesia
que o teu mistério oferece
ou do som em meu interior,
entoando a melodia
deste sentir retrocesso
e que tanto cresce!
Colapso
Suzette Rizzo

Este mundo
em que as vontades se envergam
como galhos das arvores
nas tempestades,
consome qualquer habitante.
Mundo aclive
em que eu pelo menos
rolo abismos
e sempre caio de onde estive.

Mundo ardido de fogueiras...
e o coração pobre coitado
fatalmente fulminado.
Pergunto-me por que
não passa logo uma nave
e me tira da ilusão-entrave;
Melhor é ser abduzida.
Aguardo um extraterrestre,
ou um intraterrestre, sei lá,
que de mim se enterneça
e aperte os eixos da minha cabeça...
Ou então,
regule as hélices da minha vida,
para eu funcionar sem mais esta fadiga
de viver neste planeta.




Pensamentos de um feriado
(...e um dia, alguém cantou pra mim)
Suzette Rizzo


Vejo o meu mundo preenchido
de coisas materiais...
Olho em volta da sala,
de outros aposentos,
sinto falta de um ser qualquer
para conversar
e nem mesmo ouço a voz do vento.
Não é uma solidão como outras,
não uma simples solidão.
É um vazio totalizado,
sem remédio, sem família,
vazio cada vez mais intensificado.

Enxergo agora tudo tudo muito estranho!

O planeta parece gigante
e eu tão minúscula, indefesa,
entregue nas mãos do universo,
que não sei o que fará comigo
daqui em frente,
nem mesmo se cavarei de mim 
futuros versos.
Difícil sentir o interior tão deserto,
cercado de fases tristes 
e em tudo ver tolices, crendices,
ter consciência dos meus restos.


Suzette Rizzo_January 25, 2010

Pensamentos feridos
Suzette Rizzo

Reduzida, muda, tristonha,
caminho meio tonta entre as dores
que surgem
nas sombras da calçada.
Há uma vitrine
na lateral do bar da esquina
e nela, vejo alguém de face pálida.
Serei eu essa figura tão miúda,
relaxada?
Serão meus estes apáticos pensares,
negativos, moribundos
e o tropeção na sarjeta,
os pés na poça d’água...?
Corro do vidro e de outros mais adiante,
abaixo a cabeça envergonhada,
entro em casa...

Nunca mais caminharei pelas tardes,
nunca mais verei esta figura
nem mesmo no azulejo,

nem nos sonhos, nem metade.